segunda-feira, 26 de novembro de 2012

Decifrando a China


Por Kátia Abreu
O crescimento do consumo das famílias chinesas abrirá oportunidades para o agronegócio brasileiro

Na semana em que a China escolhia, por seus ritos próprios, as lideranças que irão comandá-la pelos próximos dez anos, eu estava em Pequim, inaugurando o escritório de representação da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Embora a sucessão política chinesa nem de longe venha carregada da dramaticidade e das incertezas que marcaram as eleições americanas, o meu sentimento é de que a nova direção da China vai liderar transformações muito mais amplas e profundas do que as que estavam, e estão, no horizonte da política norte-americana.
Nos Estados Unidos e Europa, as margens de manobra de seus governantes se tornaram muito estreitas. Pode-se até dizer que seus governos estão limitados a ações puramente defensivas, e não seria incorreto afirmar que americanos e europeus estão abandonando uma visão de futuro.  Tudo o que eles querem, neste momento, é  reencontrar a vida que tinham no passado e se perdeu com a crise.
O ritmo e a dimensão do crescimento chinês nas últimas décadas são o fenômeno histórico mais impressionante da atualidade, com suas reais consequências. Testemunhamos um radical deslocamento dos eixos do poder por meios pacíficos. No pequeno tempo de uma geração, a China tornou-se a segunda economia do planeta e a força motriz da qual depende o equilíbrio econômico mundial.
Apesar de o regime político chinês ser claramente autoritário, com severas limitações ao livre desenvolvimento da sociedade civil, a substituição periódica dos quadros dirigentes faz transparecer algum tipo de luta de ideias nos bastidores do Partido Comunista. E os observadores mais próximos afirmam que o país tem se movido em direção a uma espécie de liderança coletiva, dependendo cada vez menos da vontade de um só homem, como ocorria com o regime nos tempos de Mao. As políticas de governo estão mais institucionalizadas e baseadas em consensos mais amplos.
As indicações mais confiáveis sugerem que as elites dirigentes estão de acordo com algumas correções de rumo impostas pela realidade. A contribuição das exportações para o crescimento, que tem girado em torno de três pontos percentuais nos últimos dez anos, não passará de um ponto percentual na próxima década. A continuidade do crescimento terá que se basear na ampliação do mercado interno que, por sua vez, dependerá do consumo das famílias e dos gastos públicos nas áreas sociais.
A intensidade desse crescimento terá que ser reduzida. Nos dez anos da gestão da atual liderança, o PIB chinês, medido em dólar, simplesmente quadriplicou. Para 2020, a meta anunciada é a duplicação do PIB de 2010, acompanhada também da duplicação da renda por habitante.
Podemos antever que o consumo das famílias vai crescer muito mais rapidamente do que a economia, o que abrirá grandes oportunidades para as exportações do agronegócio brasileiro. Também é visível que a China parece, agora, muito mais disposta a projetar geopoliticamente o seu poderio econômico. O país expressa de forma clara a ambição de se tornar a maior economia do planeta e isso terá consequências para além da esfera meramente econômica.
 A Ásia – e os Estados Unidos – vão sentir o peso dessa influência nova e alguns conflitos surgirão daí, com repercussão também no comércio e na política de investimentos.
O Brasil, longe dos palcos desses conflitos e distante dessa agenda conturbada, pode construir relações econômicas muito mais profícuas com a China. Bastante mais diversificada e complexa do que as relações puramente comerciais que tem hoje com a nação chinesa.
Para isto, será necessário que, estrategicamente, sejamos capazes de responder com toda a agilidade a uma indagação: O que queremos da nova China que está surgindo?
*Katia Abreu, 50, senadora (PSD/TO) é presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil, escreve aos sábados, no caderno Mercado do Jornal Folha de S. Paulo.

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