segunda-feira, 10 de junho de 2013

O preço da seca


Imagem Interna
O volume de leite industrializado pelos lacticínios do Rio Grande do Norte em 2012 atingiu o menor índice dos últimos cinco anos: 58.286 mil litros. A seca, apontada como responsável pela queda da produção, reduziu em 25% o volume industrializado entre 2008 e 2012, de acordo com a última Pesquisa Trimestral do Leite divulgada pelo IBGE. O percentual só não é maior, porque alguns lacticínios decidiram trazer leite de outros estados. Quem preferiu comprar leite só no RN, viu a produção despencar. Este é caso da Cooperativa de Energia e Desenvolvimento Rural do Seridó (Cersel), uma das maiores produtoras de laticínios da região. Com capacidade para beneficiar até 70 mil litros de leite por dia, a cooperativa não tem conseguido beneficiar nem 16 mil litros, revela Mariano Coelho, secretário da Cersel. O problema, que começou nos currais, atingiu em seguida queijarias e lacticínios e já chegou aos hipermercados.

Leite já custa o dobro no Estado

A queda na produção de leite na bacia potiguar, em função da seca, fez o preço dos derivados disparar nos supermercados da capital. O quilo de queijo antes vendido por R$ 15,90, hoje é comercializado por até R$ 24,90 - uma alta de quase 60%. O preço do litro de leite tipo C teve um incremento superior a 100%, em alguns casos. Manteiga, iogurte e coalhada também estão mais caros. Os preços, segundo o economista Eugênio Medeiros, atingiram o limite, e por enquanto, não há previsão de queda.

O aumento provocado pela redução na oferta da matéria-prima levou muitos potiguares a mudarem os seus hábitos de consumo. A artesã Tânia Maria Ferreira de Souza, 52, reduziu o consumo de leite. A também artesã Iranilde Maria da Silva, 52, o de queijo. “Eu substituo o queijo por presunto ou manteiga. Meu filho já sabe. Quando não levo é porque está caro”, diz Iranilde.

Supermercados

Não foram apenas os consumidores que precisaram mudar o comportamento em função da queda da oferta e da alta dos preços. Os supermercados e hipermercados também precisaram se ajustar à nova realidade.

Em nota, o Carrefour informou que o abastecimento de leite nas lojas de Natal está sendo feito a partir da produção de outros estados para atender a demanda dos consumidores da região, e assegurou que retomará o abastecimento de suas unidades com as marcas regionais logo que a produção regional se estabilizar.

O Walmart, operador de lojas com a bandeira Sam’s Club, Hiper Bompreço, Bompreço e Maxxi Atacado, entre outras,  também confirmou que está trazendo carregamento de fora e explicou, através da assessoria de comunicação, que “pela capilaridade da operação, tem estrutura para abastecer as gôndolas com leite vindo de outras regiões do País, como Sudeste (principalmente Minas) e o Norte (estado do Pará), quando não consegue obter o produto de produtores da região Nordeste”.

Com a queda na oferta, o leite tipo C produzido no RN, observa Eugênio Medeiros, já está custando, em alguns casos, mais caro do que o leite longa vida, produzido em estados como Minas Gerais e Espírito Santo, e trazido de carreta até o Rio Grande do Norte.

Para não afugentar os clientes, Eugênio, que também é supermercadista, da RedeMAIS, tem apostado na introdução de novas marcas, fechado parcerias com novos fornecedores, e trazido grandes carregamentos de outros estados. Apesar da estratégia, ele revela que as vendas de queijo de coalho e manteiga já caíram pela metade.

Na falta de leite in natura, boa parte das indústrias de derivados foi obrigada a recorrer ao leite em pó, no início do ano, para produzir desde coalhadas a iogurtes, onerando o produto final.

A falta do produto também provocou o fechamento de empresas no estado. Francyjose Bezerra Moura, por exemplo, foi obrigada a fechar no início do ano a ‘Casa do Queijo’ por falta de fornecedor. O negócio ia completar três meses.

“É preciso ter em mente que uma seca sempre vai ocasionar perdas, não importa onde for”, resume Aldemir Freire, economista e chefe do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Rio Grande do Norte.

Expectativa é por cenário mais favorável

Embora Aldemir Freire, economista e chefe do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no Rio Grande do Norte, não acredite em solução a curto prazo, produtores como Roberto Belarmino, que mantém um laticínio em Macaíba, já enxergam uma luz no fim do túnel.

Chuva, queda no preço dos grãos - em função do aumento da safra e da redução do rebanho, e possibilidade de renegociação das dívidas rurais desenham, segundo ele, um cenário um pouco mais favorável para quem não abandonou a atividade.  O produtor Jaedson Dantas, de São José do Seridó, concorda. Embora não tenha registrado perdas significativas no rebanho, ele também aguarda o período da bonança.

Na última semana, o ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Antônio Andrade, esteve no Rio Grande do Norte para anunciar a elaboração de mais um plano de refinanciamento das dívidas rurais, desta vez voltado para o semiárido.

Para manter o gado alimentado, Jaedson tem trazido bagaço de cana e milho de estados como Alagoas, Pernambuco e Ceará. Por semana, chega a descarregar até duas carretas. O preço do frete oscila, e por vezes supera os R$ 2 mil, por carreta.

Para Marco Aurélio de Sá, presidente da Associação Norteriograndense dos Criadores (Anorc), o pior já passou. Anderson Dantas, de Parelhas, também acredita nisso. Ele foi um dos poucos que não perdeu animais em função da seca no município. “Conheço muitos produtores que perderam tudo e fecharam a propriedade”, diz.

Ele é integrante do programa Balde Cheio, idealizado pela Embrapa, que usa uma metodologia inédita para transferir tecnologia e contribuir para o desenvolvimento da pecuária leiteira em propriedades familiares, e cobra mais investimentos em programas de extensão rural. “A gente conseguiu se virar, mas muitos produtores não conseguiram”.

Estima-se que, devido a seca metade do rebanho potiguar tenha morrido ou sido vendido para abatedouros. A Secretaria de Agricultura do Estado aguarda a recontagem dos animais para divulgar os números oficiais.

SAIBA MAIS

ENEL

Alternativas para recuperar a produção e fortalecer o setor foram discutidas ao longo da semana durante o 4º Encontro Nordestino do Setor de Leite e Derivados, realizado pelo Sebrae RN e a Associação Norteriograndense de Criadores (Anorc), no Parque Aristófanes Fernandes, em Parnamirim. O evento, que recebeu a visita do ministro da Agricultura Pecuária e Abastecimento (Mapa), Antônio Andrade, reuniu especialistas e produtores de todos os estados da região.

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