O volume de leite industrializado
pelos lacticínios do Rio Grande do Norte em 2012 atingiu o menor índice
dos últimos cinco anos: 58.286 mil litros. A seca, apontada como
responsável pela queda da produção, reduziu em 25% o volume
industrializado entre 2008 e 2012, de acordo com a última Pesquisa
Trimestral do Leite divulgada pelo IBGE. O percentual só não é maior,
porque alguns lacticínios decidiram trazer leite de outros estados. Quem
preferiu comprar leite só no RN, viu a produção despencar. Este é caso
da Cooperativa de Energia e Desenvolvimento Rural do Seridó (Cersel),
uma das maiores produtoras de laticínios da região. Com capacidade para
beneficiar até 70 mil litros de leite por dia, a cooperativa não tem
conseguido beneficiar nem 16 mil litros, revela Mariano Coelho,
secretário da Cersel. O problema, que começou nos currais, atingiu em
seguida queijarias e lacticínios e já chegou aos hipermercados.
Leite já custa o dobro no Estado
A
queda na produção de leite na bacia potiguar, em função da seca, fez o
preço dos derivados disparar nos supermercados da capital. O quilo de
queijo antes vendido por R$ 15,90, hoje é comercializado por até R$
24,90 - uma alta de quase 60%. O preço do litro de leite tipo C teve um
incremento superior a 100%, em alguns casos. Manteiga, iogurte e
coalhada também estão mais caros. Os preços, segundo o economista
Eugênio Medeiros, atingiram o limite, e por enquanto, não há previsão de
queda.
O aumento provocado pela redução na oferta da
matéria-prima levou muitos potiguares a mudarem os seus hábitos de
consumo. A artesã Tânia Maria Ferreira de Souza, 52, reduziu o consumo
de leite. A também artesã Iranilde Maria da Silva, 52, o de queijo. “Eu
substituo o queijo por presunto ou manteiga. Meu filho já sabe. Quando
não levo é porque está caro”, diz Iranilde.
Supermercados
Não
foram apenas os consumidores que precisaram mudar o comportamento em
função da queda da oferta e da alta dos preços. Os supermercados e
hipermercados também precisaram se ajustar à nova realidade.
Em
nota, o Carrefour informou que o abastecimento de leite nas lojas de
Natal está sendo feito a partir da produção de outros estados para
atender a demanda dos consumidores da região, e assegurou que retomará o
abastecimento de suas unidades com as marcas regionais logo que a
produção regional se estabilizar.
O Walmart, operador de
lojas com a bandeira Sam’s Club, Hiper Bompreço, Bompreço e Maxxi
Atacado, entre outras, também confirmou que está trazendo carregamento
de fora e explicou, através da assessoria de comunicação, que “pela
capilaridade da operação, tem estrutura para abastecer as gôndolas com
leite vindo de outras regiões do País, como Sudeste (principalmente
Minas) e o Norte (estado do Pará), quando não consegue obter o produto
de produtores da região Nordeste”.
Com a queda na oferta, o
leite tipo C produzido no RN, observa Eugênio Medeiros, já está
custando, em alguns casos, mais caro do que o leite longa vida,
produzido em estados como Minas Gerais e Espírito Santo, e trazido de
carreta até o Rio Grande do Norte.
Para não afugentar os
clientes, Eugênio, que também é supermercadista, da RedeMAIS, tem
apostado na introdução de novas marcas, fechado parcerias com novos
fornecedores, e trazido grandes carregamentos de outros estados. Apesar
da estratégia, ele revela que as vendas de queijo de coalho e manteiga
já caíram pela metade.
Na falta de leite in natura, boa
parte das indústrias de derivados foi obrigada a recorrer ao leite em
pó, no início do ano, para produzir desde coalhadas a iogurtes, onerando
o produto final.
A falta do produto também provocou o
fechamento de empresas no estado. Francyjose Bezerra Moura, por exemplo,
foi obrigada a fechar no início do ano a ‘Casa do Queijo’ por falta de
fornecedor. O negócio ia completar três meses.
“É preciso
ter em mente que uma seca sempre vai ocasionar perdas, não importa onde
for”, resume Aldemir Freire, economista e chefe do Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), no Rio Grande do Norte.
Expectativa é por cenário mais favorável
Embora
Aldemir Freire, economista e chefe do Instituto Brasileiro de Geografia
e Estatística (IBGE) no Rio Grande do Norte, não acredite em solução a
curto prazo, produtores como Roberto Belarmino, que mantém um laticínio
em Macaíba, já enxergam uma luz no fim do túnel.
Chuva,
queda no preço dos grãos - em função do aumento da safra e da redução do
rebanho, e possibilidade de renegociação das dívidas rurais desenham,
segundo ele, um cenário um pouco mais favorável para quem não abandonou a
atividade. O produtor Jaedson Dantas, de São José do Seridó, concorda.
Embora não tenha registrado perdas significativas no rebanho, ele
também aguarda o período da bonança.
Na última semana, o
ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Antônio Andrade,
esteve no Rio Grande do Norte para anunciar a elaboração de mais um
plano de refinanciamento das dívidas rurais, desta vez voltado para o
semiárido.
Para manter o gado alimentado, Jaedson tem
trazido bagaço de cana e milho de estados como Alagoas, Pernambuco e
Ceará. Por semana, chega a descarregar até duas carretas. O preço do
frete oscila, e por vezes supera os R$ 2 mil, por carreta.
Para
Marco Aurélio de Sá, presidente da Associação Norteriograndense dos
Criadores (Anorc), o pior já passou. Anderson Dantas, de Parelhas,
também acredita nisso. Ele foi um dos poucos que não perdeu animais em
função da seca no município. “Conheço muitos produtores que perderam
tudo e fecharam a propriedade”, diz.
Ele é integrante do
programa Balde Cheio, idealizado pela Embrapa, que usa uma metodologia
inédita para transferir tecnologia e contribuir para o desenvolvimento
da pecuária leiteira em propriedades familiares, e cobra mais
investimentos em programas de extensão rural. “A gente conseguiu se
virar, mas muitos produtores não conseguiram”.
Estima-se
que, devido a seca metade do rebanho potiguar tenha morrido ou sido
vendido para abatedouros. A Secretaria de Agricultura do Estado aguarda a
recontagem dos animais para divulgar os números oficiais.
SAIBA MAIS
ENEL
Alternativas
para recuperar a produção e fortalecer o setor foram discutidas ao
longo da semana durante o 4º Encontro Nordestino do Setor de Leite e
Derivados, realizado pelo Sebrae RN e a Associação Norteriograndense de
Criadores (Anorc), no Parque Aristófanes Fernandes, em Parnamirim. O
evento, que recebeu a visita do ministro da Agricultura Pecuária e
Abastecimento (Mapa), Antônio Andrade, reuniu especialistas e produtores
de todos os estados da região.
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