A tentativa de submeter os veículos de comunicação a um 'controle social' é uma forma oblíqua de censura
Nada
conspira mais contra a democracia que a relativização de seus valores –
entre eles (e sobretudo), a liberdade de imprensa. A tentativa de
submeter os veículos de comunicação a um “controle social” é uma forma
oblíqua de censura, com o indisfarçável propósito de mantê-la subjugada
politicamente.
No
Brasil, esse controle é ainda uma proposta obsessiva de parte
expressiva do PT. Na Argentina, na Venezuela e no Equador, países que se
consideram democráticos, é uma trágica realidade.
A
uniformidade dos discursos preocupa, sobretudo quando se sabe que
obedece a uma articulação continental entre grupos políticos hegemônicos
que postulam um mesmo projeto: uma América do Sul socialista.
Em
face disso, no final de outubro, empresários de rádio e televisão de
diversos países sul-americanos, reunidos na 42ª Assembleia Geral da
Associação Internacional de Radiodifusão (AIR), em Montevidéu, aprovaram
o envio de missão especial à Argentina, no dia 7 de dezembro, para
acompanhar a entrada em vigor, naquele país, da Nova Lei de Meios.
Essa
lei, com pequenas variantes, já havia sido tentada aqui, quando da
edição do III Plano Nacional de Direitos Humanos, há quatro anos,
felizmente repelida pela presidente Dilma Roussef, ainda quando
candidata.
Todas
as tentativas de enquadramento da imprensa, ao longo da história – e
não foram poucas -, resultaram numa mesma constatação: não é possível
fazê-lo sem ferir o princípio básico da democracia, que é a liberdade de
informação e expressão.
O
único controle democrático sobre a mídia é o que está na lei, mais
especificamente no Código Penal. Os crimes decorrentes de seu uso
indevido são três: injúria, calúnia e difamação, já devidamente
capitulados, e geram reparações que, no limite, podem levar o infrator a
sair do mercado.
Liberdade,
como é óbvio, não exclui responsabilidade penal para quem dela abusa.
Mesmo assim, os que reclamam da imprensa o fazem como se não estivesse
submetida a limites legais, o que tornaria indispensável
providenciá-los. É esse, em síntese, o teor sofístico das sucessivas
conferências de imprensa do PT.
A
imprensa é um termômetro: mostra a febre, mas não a cria, nem a cura.
Xingá-la, no entanto, tornou-se parte de um curioso processo de catarse,
que só convence a quem dele carece.
O
ex-presidente Lula mantém relações esquizofrênicas com o tema. Já
reconheceu diversas vezes que deve sua projeção política à imprensa,
que, ainda ao tempo do regime militar, o acolheu com entusiasmo, como
liderança popular emergente, arrostando riscos.
Mas
diz que os jornais lhe dão azia, que o combatem injustamente e coisas
afins, esquecido de que essas críticas convivem lado a lado, e em franca
desvantagem numérica, com os que o louvam. Não há uníssono na imprensa.
A
propósito, é improvável que haja um segmento da sociedade brasileira
tratado com mais severidade – e frequentemente com injustiça - que o dos
produtores rurais, em regra apresentados como vilões e retrógrados.
Não
obstante, não se registra uma única declaração de suas instituições
reclamando da imprensa ou pedindo restrição ao seu livre exercício.
Nossa opção é democrática: o debate, o exercício do contraditório.
Hoje,
com a internet, não há notícia que escape de divulgação. Se houver
alguma informação alvo de sabotagem generalizada na mídia convencional –
algo altamente improvável -, acabará vazando pela internet e chegando
ao público.
Outra
lenda: o monopólio das TVs, ponto central e recorrente dos
questionamentos. Há, no Brasil, em pleno funcionamento, nada menos que
cinco redes nacionais privadas (Globo, Bandeirantes, Rede TV, Record e
SBT), além de TVs Educativas estatais e redes regionais, sem contar as
TVs por assinatura. Não há monopólio. Há liderança, que só pode ser
quebrada mediante opção do telespectador.
Qualquer
outra medida implica censura. Uma coisa é certa: nenhum dano decorrente
da liberdade de imprensa é maior que os que ela ajuda a evitar.
*Kátia
Abreu, senadora (PSD/TO) e presidente da CNA (Confederação da
Agricultura e Pecuária do Brasil), escreve aos sábados nesta coluna.