Por Kátia Abreu
É importante reconhecer os benefícios que vieram com a globalização, o livre comércio e a economia de mercado
Estive esta semana em Genebra, onde
levei à Conferência da Organização Internacional do Trabalho (OIT)
alguns temas que considero relevantes para o mundo do trabalho como um
todo.
Representei o setor empresarial
brasileiro, em especial a agropecuária, e confesso ter me sentido
particularmente à vontade naquele encontro em que os aspectos humanos da
economia estiveram em primeiro plano.
De forma geral, o empregador brasileiro está bastante consciente das dificuldades que o mundo atravessa.
Vivemos num país que ainda precisa
avançar na redução dos índices de pobreza. Só recentemente, mais de 20
milhões de brasileiros deixaram essa condição.
Manifestei em meu pronunciamento a
certeza de que, quaisquer que venham a ser as mudanças na sociedade e na
economia, a OIT não pode renunciar às suas responsabilidades com os que
sofrem injustiças, privações e, sobretudo, com a falta de condições
decentes de trabalho.
Esse posicionamento não se confunde com
compaixão. Demanda esforço permanente para compreender as transformações
e a verdadeira natureza das crises, e para reconhecer o que está, ou
não, dentro dos limites do controle de nossa vontade.
Embora uma parte importante do mundo
esteja em crise – e padecendo do mais terrível efeito dela, que é o
desemprego – é impossível não reconhecer que ele está melhorando e se
tornando mais justo.
Nos últimos 20 anos, o número de pessoas
vivendo em pobreza absoluta foi reduzido à metade. No Brasil, este
progresso é visível, transformando a estrutura social e a própria
fisionomia das cidades e dos campos.
Neste momento, as economias emergentes e
em desenvolvimento já têm uma participação maior na produção mundial do
que as economias desenvolvidas. Importante reconhecer que tudo isto é
fruto, primordialmente, do crescimento econômico resultante da
globalização, do livre comércio e da economia de mercado.
Esses princípios surgiram e se impuseram
nas sociedades dos países ricos e foram suas melhores mercadorias de
exportação. Não seria justo nem compreensível que, diante de
dificuldades transitórias, estes países patrocinassem a volta aos
mercados protegidos e ao Estado onipresente. Tudo o que não lhes serviu
em suas marchas para o progresso.
A organização da produção econômica e o
mundo do trabalho estão em processo de transformação acelerada. A
produção está fragmentada em longas cadeias que cruzam regiões e
fronteiras nacionais. As formas tradicionais de relação de trabalho não
sobrevivem às novas realidades.
Segundo o sociólogo espanhol Manuel Castells a produtividade e a competitividade são os processos centrais da economia moderna.
A produtividade depende de um processo
contínuo de inovação que, no seu curso, desloca o trabalho entre
indústrias, setores e regiões. E a competitividade em níveis globais
apoia-se na flexibilidade.
Tudo isso conspira contra a estabilidade
do trabalho e das vidas humanas. São mudanças que, de um lado, implicam
muitos custos sociais, mas de outro criam renda e riqueza, absorvendo
novos trabalhadores, antes excluídos. Neste contexto, proteger os
direitos essenciais da pessoa obriga que sejamos inovadores e criativos.
Como bem registrou o diretor-geral da
OIT, Guy Ryder, às vezes, questões de princípio viram pretexto para a
intransigência. Padrões de garantia que serviram no passado podem ser
disfuncionais na atualidade.
E não podemos perder de vista que as
condições sociais e culturais no mundo ainda são muito heterogêneas.
Abrir-se para este reconhecimento não é sinal de fraqueza, mas de
sabedoria.
Os países emergentes não podem deixar de
ser otimistas em relação ao futuro e às transformações presentes. O
mundo do trabalho está mudando e o grande desafio é proteger o ser
humano em primeiro lugar.
KÁTIA ABREU, 51, senadora
(PSD/TO) e presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do
Brasil), escreve aos sábados na Folha de S. Paulo.