Assuntos fundiários
Por Kátia Abreu
A situação está se tornando insuportável. Quando
se trata da questão indígena, a lei só vale para alguns. Os direitos
humanos são afirmados e contrariados ao mesmo tempo, como se o Brasil
fosse obrigado a conviver com a arbitrariedade da Funai, de membros do
Ministério Público Federal, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) e
de ONGs.
Imaginem o que aconteceria se agricultores
decidissem cobrar pedágio em uma rodovia? Haveria uma gritaria ecoando
em todos os meios de comunicação e a Polícia Rodoviária Federal, as
Polícias Federal ou estaduais, acionadas pelo Ministério Público, logo
entrariam em cena. A rodovia seria liberada, e os autores do crime,
responsabilizados e punidos. Seria, de fato, o Estado de Direito
funcionando, pois nenhum cidadão pode impedir os outros de ir e vir.
Ora, o que acontece com a rodovia federal que
passa pela terra indígena Tenharim, no Amazonas? Desde 2006, os
indígenas cobram pedágio dos cidadãos que a utilizam. O valor pode
chegar a R$ 100. As pessoas são oneradas simplesmente porque alguns
indígenas assim decidiram. Acostumaram-se com a impunidade e com o
acobertamento dado pela Funai. Criam uma enorme tensão social. O que
fazem os órgãos policiais federais? Nada! O Estado de Direito, lá, nada
vale.
Agora, nesta mesma região, temos o desaparecimento
de três pessoas --foram, segundo informações, provavelmente
sequestradas por esses indígenas. Teriam sido vistas pela última vez
sendo conduzidas à força para a aldeia.
Corre a notícia de que tudo isso se deu em
represália à morte de um cacique que sofreu um acidente de moto,
embriagado. Como assim? Pessoas podem ser sequestradas em represália? De
um acidente de moto, segundo a própria polícia? Onde está a lei?
Situação análoga ocorre com os processos de
desintrusão (retirada de não índios) de terras indígenas, e de
reintegração de posse (retirada dos índios invasores). Novamente dois
pesos e duas medidas! A universalidade da lei é pisoteada.
Em Mato Grosso do Sul, com as tensões se
exacerbando sem nenhum controle, as invasões indígenas têm se
multiplicado, em aberta violação ao direito de propriedade e às decisões
judiciais.
As reintegrações de posse não são cumpridas, como
se o Estado de Direito não valesse quando se trata de ações indígenas
que contrariam abertamente a lei.
Aí entram em consideração questões "humanitárias", como se a humanidade tivesse apenas um vetor: vale apenas para alguns.
A Funai, por sua vez, sempre alega falta de
condições para intervir, quando se trata de reintegração de posse. No
entanto, encontra tais condições quando se trata da desintrusão de
terras indígenas, como aconteceu recentemente em Mato Grosso.
Na fazenda Suiá-Missú (MT), 1.800 famílias de
pequenos agricultores familiares foram jogadas ao vento, ou melhor, à
maior das intempéries. O próprio ouvidor nacional dos direitos humanos
da Secretaria de Direitos Humanos reconheceu, em uma audiência pública
na Câmara dos Deputados, que o lá ocorrido não deveria jamais se
repetir. No entanto, a repetição está ocorrendo no Maranhão.
No caso maranhense da terra Awá-Guajá, 96% dos
produtores lá instalados são da agricultura familiar e serão obrigados a
deixar a área. Os órgãos federais encarregados de aplicar a lei serão
impiedosos. Não há nenhum projeto efetivo de reassentamento dessas
famílias, senão declarações vãs e hipócritas. Vão jogá-las na estrada
tal como aconteceu com os agricultores de Suiá-Missú?
Até quando a Funai vai continuar atuando como um
Estado dentro do Estado, fazendo arbitrariamente suas próprias leis como
se não devesse prestar contas a ninguém? O Ministro da Justiça tem se
comportado como se sua pasta fosse a da Injustiça. Que Brasil é este?
KÁTIA ABREU, 51, senadora
(PMDB/TO) e presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do
Brasil), escreve aos sábados na Folha de S.Paulo
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